terça-feira, 5 de maio de 2020

Conhecendo um pouco de Lygia Fagundes Telles


LYGIA FAGUNDES TELLES nasceu em São Paulo e passou a infância no interior do Estado, onde o pai, o advogado Durval de Azevedo Fagundes, foi promotor público. A mãe, Maria do Rosário (Zazita), era pianista. Voltando a residir com a família em São Paulo, a escritora fez o curso fundamental na Escola Caetano de Campos e em seguida ingressou na Faculdade de Direito do Largo de São Francisco, da Universidade de São Paulo, onde se formou. Quando estudante do pré-jurídico cursou a Escola Superior de Educação Física da mesma universidade. Quarta ocupante da Cadeira nº 16, eleita em 24 de outubro de 1985, na sucessão de Pedro Calmon e recebida em 12 de maio de 1987 pelo acadêmico Eduardo Portella.



Foi na França, durante a Segunda Grande Guerra. Um jovem tinha um cachorro que todos os dias, pontualmente, ia esperá-lo voltar do trabalho. Postava-se na esquina, um pouco antes das seis da tarde. Assim que via o dono, ia correndo ao seu encontro e, na maior alegria, acompanhava-o com seu passinho saltitante de volta a casa.
A vila inteira já conhecia o cachorro e as pessoas que passavam faziam-lhe festinhas e ele correspondia, chegava a correr todo animado atrás dos mais íntimos para logo voltar atento ao seu posto e ali ficar sentado até o momento em que seu dono apontava lá longe.
Mas eu avisei que o tempo era de guerra, o jovem foi convocado. Pensa que o cachorro deixou de esperá-lo? Continuou a ir diariamente até a esquina, fixo o olhar ansioso naquele único ponto, a orelha em pé, atenta ao menor ruído que pudesse indicar a presença do dono bem amado. Assim que anoitecia, ele voltava para casa e levava sua vida normal de cachorro até chegar o dia seguinte. Então, disciplinadamente, como se tivesse um relógio preso à pata, voltava ao seu posto de espera.
O jovem morreu num bombardeio, mas no pequeno coração do cachorro não morreu a esperança. Quiseram prendê-lo, distraí-lo. Tudo em vão. Quando ia chegando àquela hora ele disparava para o compromisso assumido, todos os dias. Todos os dias.
Com o passar dos anos (a memória dos homens!) as pessoas foram se esquecendo do jovem soldado que não voltou. Casou-se a noiva com um primo. Os familiares voltaram-se para outros familiares. Os amigos, para outros amigos. Só o cachorro já velhíssimo (era jovem quando o jovem partiu) continuou a esperá-lo na sua esquina, com o focinho sempre voltado para aquela direção.


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