sábado, 25 de março de 2017

Trabalho escravo ainda?

Trabalho escravo é ainda uma realidade no Brasil
Esse tipo de violação não prende mais o indivíduo a correntes, mas acomete a liberdade do trabalhador e o mantém submisso a uma situação de exploração
NATALIA SUZUKI E THIAGO CASTELI

Trabalhadores escravos têm condições de trabalho muitas vezes precárias. O trabalho escravo ainda é uma violação de direitos humanos que persiste no Brasil. A sua existência foi assumida pelo governo federal perante o país e a Organização Internacional do Trabalho (OIT) em 1995, o que fez com que se tornasse uma das primeiras nações do mundo a reconhecer oficialmente a escravidão contemporânea em seu território. Daquele ano até 2016, mais de 50 mil trabalhadores foram libertados de situações análogas a de escravidão em atividades econômicas nas zonas rural e urbana.
Mas o que é trabalho escravo contemporâneo? O trabalho escravo não é somente uma violação trabalhista, tampouco se trata daquela escravidão dos períodos colonial e imperial do Brasil. Essa violação de direitos humanos não prende mais o indivíduo a correntes, mas compreende outros mecanismos, que acometem a dignidade e a liberdade do trabalhador e o mantêm submisso a uma situação extrema de exploração.
O trabalho escravo é um crime, previsto no artigo 149 do Código Penal brasileiro, como constatamos a seguir:
Art. 149: Reduzir alguém a condição análoga à de escravo, quer submetendo-o a trabalhos forçados ou a jornada exaustiva, quer sujeitando-o a condições degradantes de trabalho, quer restringindo, por qualquer meio, sua locomoção em razão de dívida contraída com o empregador ou preposto:         
Pena – reclusão, de dois a oito anos, e multa, além da pena correspondente à violência.
§ 1º Nas mesmas penas incorre quem:
I – cerceia o uso de qualquer meio de transporte por parte do trabalhador, com o fim de retê-lo no local de trabalho;    
II – mantém vigilância ostensiva no local de trabalho ou se apodera de documentos ou objetos pessoais do trabalhador, com o fim de retê-lo no local de trabalho.
§ 2º A pena é aumentada de metade, se o crime é cometido:
I – contra criança ou adolescente;
II – por motivo de preconceito de raça, cor, etnia, religião ou origem.
Qualquer um dos quatro elementos abaixo é suficiente para configurar uma situação de trabalho escravo:
·         TRABALHO FORÇADO: o indivíduo é obrigado a se submeter a condições de trabalho em que é explorado, sem possibilidade de deixar o local seja por causa de dívidas, seja por ameaça e violências física ou psicológica.
·         JORNADA EXAUSTIVA: expediente penoso que vai além de horas extras e coloca em risco a integridade física do trabalhador, já que o intervalo entre as jornadas é insuficiente para a reposição de energia. Há casos em que o descanso semanal não é respeitado. Assim, o trabalhador também fica impedido de manter vida social e familiar.
·         SERVIDÃO POR DÍVIDA: fabricação de dívidas ilegais referentes a gastos com transporte, alimentação, aluguel e ferramentas de trabalho. Esses itens são cobrados de forma abusiva e descontados do salário do trabalhador, que permanece sempre devendo ao empregador.
·         CONDIÇÕES DEGRADANTES: um conjunto de elementos irregulares que caracterizam a precariedade do trabalho e das condições de vida sob a qual o trabalhador é submetido, atentando contra a sua dignidade, como descrito no diagrama a seguir.
TRABALHO ESCRAVO CONTEMPORÂNEO
Anulação da Dignidade
E/OU
Privação da Liberdade
Alojamento precário
Dívida ilegal/servidão por dívida
Falta de assistência médica
Isolamento geográfico
Péssima alimentação
Retenção de documentos
Falta de saneamento básico e de higiene
Retenção de salário
Maus tratos e violência
Maus tratos e violência
Ameaças físicas e psicológicas
Ameaças físicas e psicológica
Jornada exaustiva
Encarceramento e trabalho forçado
Baseado no Manual de Combate ao Trabalho em Condições Análogas às de Escravo publicado pelo Ministério do Trabalho e Previdência Social Acesse: http://goo.gl/TaUkSz
Quem é o trabalhador escravo? Em geral, são migrantes que deixaram suas casas em busca de melhores condições de vida e de sustento para as suas famílias. Saem de suas cidades atraídos por falsas promessas de aliciadores ou migram forçadamente por uma série de motivos, que pode incluir a falta de opção econômica, guerras e até perseguições políticas. No Brasil, os trabalhadores proveem de diversos estados das regiões Centro-Oeste, Nordeste e Norte, mas também podem ser migrantes internacionais de países latino-americanos – como a Bolívia, Paraguai e Peru –, africanos, além do Haiti e do Oriente Médio. Essas pessoas podem se destinar à região de expansão agrícola ou aos centros urbanos à procura de oportunidades de trabalho.
Tradicionalmente, o trabalho escravo é empregado em atividades econômicas na zona rural, como a pecuária, a produção de carvão e os cultivos de cana-de-açúcar, soja e algodão. Nos últimos anos, essa situação também é verificada em centros urbanos, principalmente na construção civil e na confecção têxtil.
No Brasil, 95% das pessoas submetidas ao trabalho escravo rural são homens. Em geral, as atividades para as quais esse tipo de mão-de-obra é utilizado exigem força física, por isso os aliciadores buscam principalmente homens e jovens. Os dados oficiais do Programa Seguro-Desemprego de 2003 a 2014 indicam que, entre os trabalhadores libertados, 72,1% são analfabetos ou não concluíram o quinto ano do Ensino Fundamental.
Muitas vezes, o trabalhador submetido ao trabalho escravo consegue fugir da situação de exploração, colocando a sua vida em risco. Quando tem sucesso em sua empreitada, recorre a órgãos governamentais ou organizações da sociedade civil para denunciar a violação que sofreu. Diante disso, o governo brasileiro tem centrado seus esforços para o combate desse crime, especialmente na fiscalização de propriedades e na repressão por meio da punição administrativa e econômica de empregadores flagrados utilizando mão-de-obra escrava.
Enquanto isso, o trabalhador libertado tende a retornar a sua cidade de origem, onde as condições que o levaram a migrar permanecem as mesmas. Diante dessa situação, o indivíduo pode novamente ser aliciado para outro trabalho em que será explorado, perpetuando uma dinâmica que chamamos de “Ciclo do Trabalho Escravo”.
Para que esse ciclo vicioso seja rompido, são necessárias ações que incidam na vida do trabalhador para além do âmbito da repressão do crime. Por isso, a erradicação do problema passa também pela adoção de políticas públicas de assistência à vítima e prevenção para reverter a situação de pobreza e de vulnerabilidade de comunidades. Dentre essas políticas, estão as ações formativas no âmbito da educação, como aquelas propostas pelo programa Escravo, nem pensar!.


terça-feira, 21 de março de 2017

Vamos ler meu povo!




Desigualdade social é entrave para inclusão digital
Pesquisa mostra que cerca de 3,5 milhões de crianças e adolescentes
brasileiros nunca acessaram a internet

Nas áreas urbanas, 84% dos jovens estão conectados contra 59% das áreas rurais.
Cerca de 3,5 milhões de crianças e adolescentes brasileiros, com idade entre 9 e 17 anos, isto é, 
em idade escolar, nunca acessaram a internet em suas vidas e, em 2015, cerca de 6 milhões não 
estavam conectados à rede – 20% da população dessa faixa etária.
Os dados são da pesquisa TIC Kids Online Brasil 2015, realizada pelo Comitê Gestor da Internet
 no Brasil (CGI.br) com a finalidade de investigar o acesso e uso das TIC (Novas Tecnologias de 
Informação e Comunicação) entre os jovens do País.
O levantamento apontou a desigualdade socioeconômica como um entrave para a inclusão digital
No Brasil, enquanto 97% dos jovens da classe AB são usuários de Internet e 85% da classe C, 
apenas 51% das crianças e adolescentes da classe DE têm acesso à rede.
Contrastes regionais também ficaram evidentes. Quando o escopo é a proporção dessa 
população que não acessou a Internet em razão da falta de disponibilidade no domicílio (um total de 15%), o número mais expressivo refere-se aos jovens moradores da área rural (30%), da região Norte do País (31%), das classes D e E (36%) e pertencentes
 a núcleos familiares que ganham até 1 salário mínimo (31%).
Também quando o foco são os jovens conectados os resultados apontam para
 disparidades regionais e socioeconômicas no acesso. Em 2015, nas áreas urbanas, 84% das 
crianças e adolescentes estavam conectadas, contra 59% nas áreas rurais. Na região Sul, 90% dos jovens declararam ser usuários de Internet e no Norte, apenas 56%.
Ainda segundo a pesquisa, no que diz respeito à frequência de uso da Internet, houve um 
aumento significativo de 2014 para o ano passado. Em 2014, 21% disseram que acessavam
 a rede mais de uma vez por dia, já em 2015 esse número subiu para 66%. O celular provou-se
 mais uma vez o meio mais utilizado pelos jovens: 83% acessaram a rede por meio do
 equipamento.
O estudo também abordou questões sobre intolerância e discurso de ódio na rede. De acordo 
com os resultados, uma em cada três crianças e adolescentes (37%) declarou ter visto alguém 
ser discriminado na Internet e 6% declararam ter sofrido algum tipo de discriminação na
 Internet no último ano. Entre os motivos, 23% das crianças citaram preconceito de cor ou raça;
 13% mencionaram aparência física; e 10%, relacionamento entre pessoas do mesmo sexo.
Revista Carta Educação, outubro 2016.

domingo, 19 de março de 2017

A poesia concreta de Augusto de Campos

A poesia concreta de Augusto de Campos

A poesia concreta foi idealizada no Brasil pelos poetas Augusto de Campos, Haroldo de Campos e Décio Pignatari, com o propósito de ampliar a ideia do que é poesia ao potencializar e integrar os aspectos físicos ou concretos do som, da visualidade e do sentido das palavras.

Os poemas concretos são experiências de “design de linguagem”, conforme definiu Pignatari. Neles, os poetas concretos eliminam a sintaxe da linguagem e organizam o sentido do poema pela disposição e relação das palavras entre si no espaço da página. Esses poemas não foram pensados para a página do livro, mas para o cartaz: são poemas-cartazes para serem lidos no espaço público.
Essa poesia propôs ainda uma releitura da tradição poética brasileira e internacional, renovou os parâmetros técnicos dos estudos poéticos (com o auxílio dos estudos linguísticos e semióticos), recolocou em circulação poetas importantes que estavam esquecidos como Oswald de Andrade e Sousândrade e traduziu com grande qualidade (em vários casos, pela primeira vez) autores internacionais que passaram a enriquecer a reflexão cultural no Brasil.
Também foram autores importantes do movimento os poetas Ronaldo Azeredo, José Lino Grünewald, Ferreira Gullar e Pedro Xisto. A produção da poesia concreta brasileira ganhou repercussão internacional e estabeleceu ligações e influência nas artes visuais, no design e na música – inclusive, na música popular brasileira, com um diálogo intenso com os criadores do Tropicalismo.
As criações e as reflexões críticas promovidas pela poesia concreta, ainda hoje, aqui e no exterior, contribuem para novos desenvolvimentos da linguagem. Nas últimas décadas, temos visto um grande desenvolvimento da criação poética em novos suportes e formas de manifestação como o cartaz, o poema-objeto, a performance poética e o poema em animação gráfica digital sonorizada.
poesia concreta

A poesia concreta buscou o desenvolvimento dos aspectos visuais do texto

Hoje com 85 anos, Augusto de Campos mostrou-se o poeta mais comprometido com as aspirações das propostas iniciais do movimento concreto, o que dificultou a recepção de sua poesia após o declínio deste em meados dos anos 60. Sua obra demorou a ser publicada comercialmente e recebeu crítica polêmica. Entretanto, esta situação começou a mudar nos últimos anos, principalmente após sua conquista, no ano passado, do Prêmio Ibero-americano de Poesia Pablo Neruda.
Sua obra está reunida, sobretudo, nos livros Viva Vaia (1979), Despoesia (1994), Não (2003) e Outro (2015). Outros trabalhos importantes como Poemóbiles (1974) e Caixa Preta (1975) não puderam ser integralmente incorporados aos livros por se tratarem de poemas-objeto, pouco adaptáveis ao formato impresso. Essa é uma característica marcante em sua obra: a constante pesquisa poética com diferentes suportes e técnicas, ultrapassando fronteiras e explorando novos territórios híbridos de linguagem.
Nas últimas décadas, seus poemas têm surpreendido os leitores com os recursos das novas mídias: painéis eletrônicos, holografias, projeções em laser e animações digitais.
Na recepção de sua obra, alguns críticos chamam a atenção para questões que são comuns a outros poetas praticantes da poesia experimental, tais como a crise da linguagem e a busca do diálogo entre diferentes códigos de linguagem (o verbal e o visual, por exemplo).
Nos últimos anos, após o impacto da publicação dos seus livros mais recentes – Não e Outro, alguns críticos têm buscado distinguir questões próprias da poesia de Augusto: sua atenção aos valores contingentes da materialidade dos signos, a introdução da espacialidade e do movimento na linguagem, sua tendência para a montagem sintética, a tensão em sua obra entre os vetores da poética imanente e da poética da angústia e a relação entre linguagem e morte.
Entretanto, a atuação contínua de Augusto por mais de seis décadas, laboriosa e inquieta, reagindo criativamente às transformações do contexto sócio-cultural e tecnológico, com os impasses e os conflitos que possa conter, afigura-se como um caleidoscópio de signos que apenas começamos a descobrir. Augusto de Campos é, hoje, um dos maiores poetas em atividade no mundo.
*Julio Mendonça é poeta, doutor em Comunicação e Semiótica pela PUC – São Paulo, especialista em Gestão Pública (UFABC) e coordenador do Centro de Referência Haroldo de Campos da Casa das Rosas



segunda-feira, 13 de março de 2017

O assédio e a violência de gênero

O assédio e a violência de gênero
O assédio contra mulheres em transportes coletivos reafirma o espaço público como reprodutor da violência de gênero
CARLA CRISTINA GARCIA

O primeiro deles foi a divulgação da pesquisa Chega de Fiu Fiu – Uma campanha contra o assédio sexual em espaço público, organizada pelo site Think Olga, em 2013.
Foram entrevistadas 7.762 mulheres, e 99,6% delas declararam já ter sofrido algum tipo de assédio sexual nesses ambientes.
Alguns números revelados pela pesquisa Chega de Fiu Fiu dão a dimensão do cenário vivido pelas mulheres nos espaços públicos. Aqui destacamos alguns que servirão de embasamento para a discussão no decorrer do texto.
Uma das perguntas era: “Onde você já recebeu cantada?”; 98% responderam na rua; 64% no transporte público (guarde este número), 33% no trabalho, 77% na balada, e 80% em parques, shoppings e cinemas (na pesquisa as entrevistadas puderam escolher mais uma de opção).
Na sequência, a pesquisa perguntou: “Você acha que ouvir cantada é legal?”; 83% disseram não, 17% responderam sim. Ou seja, a imensa maioria das mulheres não gosta de ouvir cantadas quando caminham pelas ruas.
Esse dado revela outro, assustador: 81% das entrevistadas revelaram já ter deixado de fazer alguma coisa por medo de serem assediadas pelos homens.
E mais triste ainda: 90% das participantes revelaram que já deixaram de usar roupa decotada por medo de sofrer algum tipo de assédio.
Esse resultado da pesquisa Chega de Fiu Fiu nos remete ao estudo realizado pelo Instituto de Pesquisa Aplicadas (Ipea), cujos dados, após a correção de um erro na divulgação do estudo, mostram que cerca de 26% dos entrevistados declararam que “mulheres com roupa curta merecem ser atacadas”.
Trata-se de um número assombroso, pois representa um quarto da população brasileira.
Logo, 50 milhões de pessoas debitam nas mulheres a culpa pelos assédios sexuais sofridos nos espaços públicos.
Ainda de acordo com a pesquisa, 58,5% dos entrevistados acreditam que “se as mulheres soubessem se comportar, haveria menos estupro”.
Portanto, se a mulher é cantada na rua, assediada no transporte público e, no caso mais grave, estuprada a culpa é dela. Os números de ambas as pesquisas são ainda mais terríveis quando pensamos no contexto político em torno das políticas às mulheres nos últimos 15 anos.
As mulheres serem vítimas de assédio sexual no transporte não é novidade
O assunto, porém, ganhou repercussão nacional quando os meios de comunicação noticiaram uma série de casos ocorridos no metrô de São Paulo.
Segundo dados da Secretaria de Segurança Pública do Estado, cem mulheres fizeram denúncias em 2013, após serem vítimas de assédio sexual em ônibus, metrô e trens da capital paulista.
Em 2014, já foram registrados 26 casos de abuso sexual no metrô paulistano, oito homens foram presos por causa de tal crime.
Em reportagem veiculada em programa televisivo, Adriana Barbosa, vítima de abuso sexual no metrô de São Paulo, relatou o ocorrido: o homem a seguiu e, dentro do vagão, a encurralou e a apalpou em suas partes íntimas. Quando as portas do vagão se abriram, Adriana começou a gritar e os seguranças conseguiram prender o abusador.
De acordo com a reportagem, dos 26 homens que foram presos acusados de assediar sexualmente de mulheres, apenas um permanece preso.
As denúncias e reportagens sobre assédios sexuais no transporte público fizeram com que a presidenta Dilma Rousseff utilizasse o seu perfil no Twitter para pedir às mulheres que não tenham medo e denunciem tais casos.
“A ação de criminosos que assediam e abusam de mulheres em ônibus, trens e metrôs envergonha a nossa sociedade. Venho pedir às vítimas que não se intimidem em denunciar. E às polícias que não se omitam em combater a prática. O Brasil de hoje não comporta mais qualquer tipo de violência contra a mulher”, declarou.
Outra reação foi realizada pelo coletivo feminista Mulheres em Luta, que no dia 4 de abril distribuíram alfinetes para que as mulheres utilizassem contra os “encostadores” do metrô.
O kit de defesa continha, além do objeto pontiagudo, a mensagem lema da campanha: “Não me encosta que eu não te furo”. As organizadoras do ato alegaram que a ação visava dar o “mínimo de condições para que as mulheres se protejam em casos de abuso”.
A punição resolve?
Nas várias reportagens veiculadas, especialistas no assunto disseram que a lei para os casos de assédio sexual necessita de um flagrante. Quando não há, as vítimas precisam de testemunhas para levar o caso à frente. Do outro lado, as vítimas afirmam serem desencorajadas, quando vão à delegacia, a levar a denúncia adiante.
Elas são informadas de que “não vai dar em nada”. Além de pertencer à nossa cultura machista, tal orientação faz com que milhares de mulheres vítimas de assédio sexual se calem, o que tornam os registros da violência imprecisos.
É óbvio que as leis devem ser mais rígidas para casos como esses, mas devemos levantar a seguinte questão: apenas focar na centralidade de um regime punitivo vai resolver a questão do assédio sexual do qual são vítimas as mulheres nos espaços públicos? Podemos encaminhar a nossa resposta a partir do exemplo da Lei Maria da Penha.
Promulgada em 2006, a lei registrou um aumento de 600% de denúncias feitas por mulheres por causa de violência física e sexual, de acordo com dados do Disque 100 do governo federal.
No entanto, infelizmente a divulgação da lei e os inúmeros dispositivos judiciais para ajudar às vítimas não colaboraram para o retrocesso do registro do número de casos de violência contra a mulher.
Pelo contrário: a cada cinco minutos, uma mulher é vítima de violência física, de acordo com o Mapa da Violência 2012 – Homicídio de mulheres no Brasil.
Um novo projeto de sociedade
Para além de uma radicalização do sistema punitivo, é necessário pensar na estrutura que promova esses dados macabros sobre violência contra as mulheres.

Enquanto a questão ficar centrada no âmbito jurídico/punitivo, pouco ou nada vai mudar.
É necessário pensar mecanismos que desmontem o paradigma patriarcal e machista predominante na estrutura familiar e escolar.
Sim, o projeto pedagógico vigente no Brasil é todo ancorado em valores familistas e reprodutores, que enxergam a mulher não enquanto sujeito, mas como máquina de fazer filhos.
Assim, alimenta-se que toda mulher está disponível para homens, sendo seu corpo um espaço público.
Eis aí a importância da chamada feminista: “Nossos corpos, nossas regras”.
Neste momento em que o debate está posto, ocorre no Congresso Nacional uma discussão de suma importância à construção de novas mentalidades no Brasil.
O Plano Nacional de Educação (PNE), com metas que deveriam estar vigente de 2010 a 2020, traz em sua base estrutural a erradicação de todas as formas de preconceito (sexual, de gênero, racial e de orientação sexual). Ou seja, se aprovado, a erradicação do preconceito de gênero vai passar a fazer parte da grade curricular da educação brasileira, um avanço fundamental de combate ao machismo e ao sexismo.
Quando adolescentes entram em contato com uma pedagogia que visa desconstruir velhos preconceitos, novos sujeitos daí surgirão. Porém, como tudo aquilo que visa derrubar o sistema patriarcal, o PNE 2014 desencadeou uma guerra entre setores progressistas e fundamentalistas e corre risco de ser desfigurado.
Além de um novo projeto pedagógico, uma sociedade não sexista também pressupõe outra comunicação, principalmente quando pensamos nas telenovelas, em que o destino das personagens femininas é sempre a maternidade, reforçando a velha ideia de que mulheres só são plenas quando casadas e mães.
Pressupõe que as mulheres ocupem o espaço legislativo (elas são 9% no Congresso Nacional); que superemos o conceito de gênero e sua divisão positivista; que a ideia de profissão masculina e feminina seja banida e assim sucessivamente…
Para que a ideia masculina segundo a qual o corpo da mulher é um espaço público seja superada, é necessário invertemos (destruir?) toda a lógica na qual estamos inseridas, em que tudo aquilo que se aproxima do feminino é tratado como abjeto (vide homens afeminados, travestis e transexuais).
E aí vale a pena resgatar a nossa velha amiga Simone de Beauvoir.
Em 1947, em seu livro O Segundo Sexo, ela afirma que as mulheres não existem e não passam de uma construção social a partir do prisma masculinista.
O conceito de mulher e de homem são dois instrumentos políticos de poder que atua sob os corpos a partir de seus órgãos genitais e, a partir daí, define os papéis de gênero na sociedade ocidental.

Esse percurso final pode parecer um tanto absurdo e radical, mas não é. Absurdo e diabólico é o cotidiano das mulheres abusadas dentro do metrô e no transporte público como um todo (sem contar os outros espaços públicos). Este sim deve ser um incômodo constante contra o qual devemos lutar para que seja eliminado. A libertação da mulher é também a libertação de todo o resto da sociedade.

*Carla Cristina Garcia é doutora em Ciências Sociais e professora do Departamento de Sociologia da PUC-SP

segunda-feira, 6 de março de 2017

Aviso da lua que menstrua...

Aviso da lua que menstrua
Moço, cuidado com ela!
Há que se ter cautela com esta gente que menstrua...
Imagine uma cachoeira às avessas:
cada ato que faz, o corpo confessa.
Cuidado, moço
às vezes parece erva, parece hera
cuidado com essa gente que gera
essa gente que se metamorfoseia
metade legível, metade sereia.
Barriga cresce, explode humanidades
e ainda volta pro lugar que é o mesmo lugar
mas é outro lugar, aí é que está:
cada palavra dita, antes de dizer, homem, reflita..
Sua boca maldita não sabe que cada palavra é ingrediente
que vai cair no mesmo planeta panela.
Cuidado com cada letra que manda pra ela!
Tá acostumada a viver por dentro,
transforma fato em elemento
a tudo refoga, ferve, frita
ainda sangra tudo no próximo mês.
Cuidado moço, quando cê pensa que escapou
é que chegou a sua vez!
Porque sou muito sua amiga
é que tô falando na "vera"
conheço cada uma, além de ser uma delas.
Você que saiu da fresta dela
delicada força quando voltar a ela.
Não vá sem ser convidado
ou sem os devidos cortejos..
Às vezes pela ponte de um beijo
já se alcança a "cidade secreta"
a Atlântida perdida.
Outras vezes várias metidas e mais se afasta dela.
Cuidado, moço, por você ter uma cobra entre as pernas
cai na condição de ser displicente
diante da própria serpente
Ela é uma cobra de avental
Não despreze a meditação doméstica
É da poeira do cotidiano
que a mulher extrai filosofando
cozinhando, costurando e você chega com a mão no bolso
  julgando a arte do almoço: Eca!...
Você que não sabe onde está sua cueca?
Ah, meu cão desejado
tão preocupado em rosnar, ladrar e latir
então esquece de morder devagar
esquece de saber curtir, dividir.
E aí quando quer agredir
chama de vaca e galinha.
São duas dignas vizinhas do mundo daqui!
O que você tem pra falar de vaca?
O que você tem eu vou dizer e não se queixe:
VACA é sua mãe. De leite.
Vaca e galinha...
ora, não ofende. Enaltece, elogia:
comparando rainha com rainha
óvulo, ovo e leite
pensando que está agredindo
que tá falando palavrão imundo.
Tá, não, homem.
Tá citando o princípio do mundo!
Autora: Elisa Lucinda

sábado, 4 de março de 2017

É fácil escrever

As dificuldades na escrita é fato no cotidiano escolar, e para tanto, pensei em viabilizar uma situação diferenciada para aqueles alunos que tinham dificuldade na escrita e aversão na aula de produção textual quando era para produzir, pensei em facilitar sem sair do contexto que é preciso para desenvolver a fluência na escrita. Observe como fica mais fácil para quem nunca conseguiu produzir. E pode desenvolver qualquer tema.

A partir da leitura dos textos motivadores e com base nos conhecimentos construídos ao longo de sua formação, redija as partes do texto: introdução, a partir da introdução faça dois tópicos de desenvolvimento e por último produza a conclusão, lembrando que na conclusão você precisará trazer uma proposta de solução para a problemática.  Respeita a estrutura do texto, margens direita e esquerda, como também, o espaçamento dos parágrafos.

1º parágrafo de introdução


1.        

2.        

3.        

4.        

5.        

6.        


Desenvolvimento
1º tópico (a partir da ideia da introdução faça dois tópicos de um futuro parágrafo de desenvolvimento, ou seja, não mais do que duas linha para esse primeiro tópico, lembrando que precisa retirar das ideias que trouxe na introdução)

7.        

8.        


2º tópico (a partir da ideia da introdução faça dois tópicos de um futuro parágrafo de desenvolvimento, ou seja, não mais do que duas linha para esse primeiro tópico, lembrando que precisa retirar das ideias que trouxe na introdução)

9.        

10.    


Conclusão
Feche o pensamento trazendo uma proposta de intervenção para a solução parcial ou total da problemática, lembrando de respeitar os direitos humanos e respeitando o ser humano de modo geral.


11.    

12.    

13.    

  Professora lista 5 dicas para não se perder na hora de estudar atualidades Querer estudar cada desdobramento de cada grande acontecimento ...