10 pontos-chave para entender a cloroquina e a
hidroxicloroquina
Com Bolsonaro fazendo propaganda do remédio, o
‘Nexo’ traz perguntas e respostas acerca de seu uso na pandemia
Cesar Gaglioni 09/07/2020
às 20h08 - Jornal Nexo
Diagnosticado
com a covid-19, Jair Bolsonaro afirmou na terça-feira (7) ter começado a tratar
a doença causada pelo novo coronavírus com hidroxocloroquina, um derivado da cloroquina.
Desde o início da pandemia, o presidente faz propaganda do remédio. Abaixo,
o Nexo traz dez perguntas e respostas sobre as substâncias e
seus efeitos, baseado nas evidências científicas disponíveis.
O que é a
cloroquina, e qual sua diferença para a hidroxicloroquina?
A cloroquina
é um medicamento sintético usado para o tratamento de doenças como malária,
artrite e lúpus. A hidroxicloroquina, derivada da cloroquina, também é usada nesses
casos, mas tem um processo diferente de fabricação e é considerada menos tóxica
para o organismo.
A cloroquina
e a hidroxicloroquina têm efeito sobre a covid-19?
As
evidências científicas, obtidas nos estudos desenvolvidos até o momento, dizem
que a cloroquina e a hidroxicloroquina são ineficazes para o tratamento da
covid-19. “Temos evidências suficientes para saber que não há nenhum impacto
para pacientes hospitalizados com covid-19”, disse Soumya Swaminathan,
cientista-chefe da OMS (Organização Mundial da Saúde).
Por que a
cloroquina e a hidroxicloroquina começaram a ser usadas no tratamento da
covid-19?
Em fevereiro
de 2020, um estudo do Instituto de Virologia de Wuhan, na China, indicou
eficácia no controle do vírus em testes de laboratório, mas sem apontar efeito
positivo em humanos. No mês seguinte, um estudo de cientistas franceses afirmou
que as substâncias fizeram a carga viral de pacientes desaparecer – mas sem
avaliar se houve melhora clínica. As duas pesquisas despertaram
o interesse acerca da cloroquina e ela passou a ser mais
estudada. Posteriormente, uma série de novos estudos constatou sua ineficácia
contra a covid-19.
Por que muitas pessoas dizem ter sido curadas pela
cloroquina e hidroxicloroquina?
A
recuperação da maioria dos pacientes da covid-19 se dá por reações naturais do
próprio corpo. Não há evidências científicas que
sustentem que pacientes que tomaram a cloroquina ou a hidroxicloroquina se
recuperaram como consequência direta do uso do remédio. Nesses casos, a
afirmação é feita com base naquilo que é chamado de evidência
anedótica, casos individuais ou isolados que não têm
qualquer valor científico.
A cloroquina
e hidroxicloroquina têm efeitos colaterais comprovados?
Dor de
cabeça, enjoo, vômitos, diarreia, coceiras, irritações na pele, confusão
mental, convulsões, queda da pressão arterial, arritmia, fraqueza muscular,
perda da visão e sangramentos são alguns dos efeitos colaterais da
cloroquina e da hidroxicloroquina. Seu uso, portanto, não só é ineficaz contra
a covid-19 como pode trazer outros problemas para o paciente, segundo as
evidências científicas disponíveis.
Por que é um
problema o presidente da República fazer propaganda para a cloroquina e
hidroxicloroquina?
Porque não
há comprovação da eficácia das substâncias, que ainda podem causar uma série de
efeitos colaterais. Além disso, a propaganda pode aumentar as buscas pelo
remédio, esvaziando os estoques para quem realmente precisa dele, como ocorreu em março de 2020 em diversas cidades
do país. Há também perigos na
automedicação. Segundo Luiz Henrique Mandetta, ex-ministro
da Saúde, Bolsonaro insiste no medicamento porque é uma forma de dar confiança
às pessoas. Assim, o presidente poderia levar adiante seu plano de reabrir a economia.
Quem decide
qual paciente pode tomar cloroquina e hidroxicloroquina no Brasil?
De acordo
com orientação do Ministério da Saúde, cabe ao
médico decidir se vai receitar a cloroquina e a hidroxicloroquina para o
tratamento da covid-19. Nesses casos, o paciente precisa assinar um termo
expressando a autorização para receber as substâncias. Médicos que ainda receitam os medicamentos o fazem por
ver neles um último recurso que pode eventualmente dar certo ou por pedido dos
pacientes.
Outros
países usam cloroquina e hidroxicloroquina no tratamento da covid-19?
Além do
Brasil, países como Argélia, Turquia, Tailândia, Quênia e Senegal se utilizam
da cloroquina e da hidroxicloroquina para o tratamento de pacientes com
covid-19. Órgãos sanitários de países como Portugal, EUA e França suspenderam o uso das substâncias pelo fato
de elas não apresentarem eficácia contra a covid-19.
Como o
estudo contestado da Lancet sobre a cloroquina e a hidroxicloroquina turvou o
debate sobre o remédio?
Em maio de
2020, a respeitada revista britânica The Lancet publicou
um estudo que reafirmava a ineficácia da cloroquina
para o tratamento da covid-19 e apontava seus efeitos colaterais. Dias depois, surgiram
contestações acerca da base de dados usada na pesquisa,
algo que expôs fragilidades do artigo. Em
entrevista ao Nexo, Marcia
Furquim, editora científica da Revista Brasileira de Epidemiologia, disse que
os problemas surgiram da pressa em apresentar resultados. Segundo ela, as
questões do estudo acentuaram
a politização do debate acerca das substâncias.
Mesmo com fragilidades metodológicas, o estudo chegou às mesmas conclusões de
diversas outras pesquisas que não foram contestadas e que apontaram a
ineficácia dos medicamentos para a covid-19.
Quantas
unidades do medicamento o Brasil já produziu? E quantas recebeu de doação dos
EUA?
Entre março
e abril de 2020, o Exército brasileiro produziu 1,2 milhão de doses de
cloroquina. A produção foi paralisada temporariamente por falta de
insumos, mas foi retomada em junho. Após
descartarem o uso do remédio para a covid-19, os EUA doaram 2 milhões de doses para o Brasil também em
junho. Além da propaganda pessoal de Bolsonaro, a Secretaria de Gestão e
Trabalho da Educação na Saúde, do Ministério da Saúde, publicou um vídeo em sua
conta no YouTube no fim de junho em que orienta pacientes com sintomas leves
a procurar atendimento médico. A peça mostra caixas de cloroquina e diz que os pacientes
poderão ter a opção de “receber medicamentos”.
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